Atenção: Vendem-se acções da fábrica dos meus sonhos!

Levanta vôo. As tuas asas prateadas esticar-se-ão mais do que imaginas. A liberdade nasce quando tu nasces. E este nascimento não é o sair da escuridão de um ventre para entrar num lugar cheio de luz por fora mas às vezes tão frio e "inox" nos seus cantos. Este nascimento é quando olhas e reparas. Quando tu olhas, reparas e percebes a magia que te rodeia, a tua fragilidade e a força que esta fraqueza pode ganhar com o avanço do "reparar" e do "contemplar". Um dia vais sentir as tuas asas a tomarem posse de todo o teu corpo, a levarem-te para o mundo do visionário, do que tudo vê e do que tudo pode vêr. E assim, irás mais longe do que a imaginação, mais longe do que um poeta, mais longe do que um astronauta. É com um brilho nos olhos e um sorriso que brota ansiedade que tu esperas pelo teu "Take Off".

Há tanto tempo que a distância nos roubou o tempo para estarmos juntos. Se estivésses aqui contava-te as histórias que sempre contamos quando nos encontramos. Ainda que sejam histórias repetidas estamos sempre dispostos a ouvir e a contar. É tão difícil encontrar alguém que oiça as nossas aventuras pela milésima vez, alguém que sorria com uma pequena história sem sentido que ganhou toda a importância por causa da pessoa com quem a vivemos. Sim, isto é cumplicidade. Sim, isto é saudade!

Há ligações invisíveis entre todos nós. Não sabemos que o amigo de um amigo é também o amigo de uma outra amiga. Há quem se cruze com o homem da sua vida muito antes de o conhecer e não o saiba, e talvez nunca o venha a saber.
É a descoberta destas pequenas conexões que torna o mundo cada vez mais pequeno, mais humano. Encontrar e Reencontrar alguém em lugares improváveis para tal encontro, descobrir afinidades, atravessar uma passadeira de uma grande cidade e reparar que o condutor do carro da frente é um amigo com quem partilhámos parte de uma infância vivida numa pequena aldeia, tudo isto faz-nos ter a noção de pequenos momentos, que de tão perfeitos, mais parecem ser parte de uma grande teia inquebrável...
A vida pode ser surpreendente. Se fossemos nós a escrever a nossa vida, antes de a vivermos, certamente que colocaríamos nela momentos destes para nos lembrarmos que tínhamo sido nós a escrevê-la, como se fossem um sinal para acordar do esquecimento.

Apontamento

"A minha alma partiu-se como um vaso vazio
Caiu pela escada excessivamente abaixo
Caiu nas mão da criada descuidada
Caiu, e eu fiz-me em mais pedaços que havia loiça no vaso
(...)
E os Deuses que há debruçam-se da escada para ver o que a criada fez de mim
(...)
O que era eu - um vaso vazio?
(...)
Alastra a escada atapetada de estrelas
Ao fundo um caco brilha, entre os astros
A minha obra? A minha alma principal?
A minha vida
E os Deuses olham-na por não saberem porque ficou ali"

Álvaro de Campos

Somos cúmplices quando somos genuínos. Somos cúmplices quando estamos em silêncio há duas horas e não damos conta, o silêncio não nos perturba. Somos cúmplices quando vivemos para lá das nossas próprias histórias, quando os mundos se cruzam uma vez e nunca mais se desatam. Nem que passassémos uma vida longe um do outro, ao primeiro segundo do reencontro saberíamos encontrar o que tínhamos sido juntos.